A nossa luta começa por continuar a viver como vivíamos
Estou chocada e cheia de rancor por causa dos acontecimentos horrorosos em Paris, nesta sexta-feira, 13 de Novembro de 2015.
Conseguiram atingir-nos, tocando naquilo que para nós é mais precioso. Eles pensavam que tinham matado o jornal Charlie Hebdo em Janeiro passado, matando os jornalistas que lá se encontravam, mas o povo reuniu-se e manifestou com o slogan «somos todos Charlie». Agora tentaram matar os franceses todos em conjunto. Não fizeram distinção nenhuma. Designaram os franceses todos como seus inimigos.
Ninguém pode agora negar que esta guerra não nos diz respeito. Não a quisemos, mas temos de levá-la até ao fim.
Eles não dispararam num sítio qualquer. Escolheram matar a juventude francesa: num estádio de futebol, numa sala de espectáculos, nas esplanadas de restaurantes e cafés. Foi a vida da juventude francesa que foi visada, nestes locais onde, em toda a França, à noite, os jovens se reúnem, bebem, fumam, dançam, no seu dia-a-dia rotineiro. Quiseram punir a juventude francesa a tiro e bombas.
Atingindo as esplanadas, quiseram pôr fim à nossa maneira de viver juntos, em grupo. Atingindo as salas de espectáculos, quiseram acabar com a nossa liberdade cultural, os nossos artistas, a nossa imaginação. Atingindo o Stade de France quiseram acabar com o nosso desporto mais popular e, com ele, todos os nossos desportos.
Querem destruir aquilo que nos faz viver juntos, os elos que nos ligam entre cidadãos, que são os valores da República. Num Ocidente que eles detestam, a nossa liberdade, a nossa laicidade, designam-nos como um alvo prioritário.
Assistimos então à subida de vários sentimentos que nos invadem o espírito: o horror, o rancor, a dor, o choque. E o orgulho também. Do orgulho não se estava à espera. Porque o que eles nos querem arrancar, queremos defendê-lo com toda a nossa força, e, mais ainda, quando nos damos conta da sua fragilidade. Porque os franceses são mesmo assim: são livres e orgulhosos. E não se podem sentir seguros renunciando aos seus princípios fundamentais.
A República é o alvo dos terroristas e é o nosso bem mais precioso. E vamos combater para defender estes valores republicanos. E a nossa luta começa por continuar a viver como vivíamos. Isto já é combater.
Hoje, domingo 15 de Novembro, em Paris, no bairro onde vivo, palco de vários atentados, as ruas estavam cheiíssimas. As ordens policiais e governamentais pediam-nos para não sair. Falam-nos em Estado de Urgência. Mas ninguém consegue ficar em casa. Os parisienses precisam de se ver, de falar, de lutar.
Os franceses não têm medo. Os franceses vão sempre lutar. Os franceses vão ganhar.
Sónia Ferreira, filha de riachenses, nasceu em França e reside no bairro Canal Saint Martin, a 150 metros do Petit Cambodge e do Carillon, que foram as primeiras esplanadas atacadas na sexta-feira passada, onde morreram 14 pessoas. Diz que nunca se sentiu tão francesa, tão parisiense como nestes últimos dias.