Helena Pinto, uma autarca capaz de dar a volta a isto?
Uma concorrente de peso à Câmara Municipal de Torres Novas, apresenta o Bloco de Esquerda. Um retorno às origens, Helena Pinto com, na minha opinião, quatro anos de atraso. «Vamos acabar com esse ciclo de obras e construção de rotundas e dar início a um novo ciclo de políticas assentes na procura de soluções para a resolução dos problemas das pessoas», leio numa nota do Diário de Notícias.
Helena, amiga, cuida-te. Não se acaba com o que já acabou – esses ciclos de obras do socialismo rodriguista em contínuo crescimento da dívida autárquica. De momento, não há dinheiro para as mais simples despesas, para tapar alguns dos muitos buracos, alcatrão nem pensar, despesas com o património, a biblioteca, foi chão que deu uvas, aguarda-se como um maná bíblico o empréstimo do PAEL, a futura instalação do edifício camarário aí está, sem resolução, pior, com mais um berbicacho que cairá sobre os munícipes. Obras, prometem-se ainda, assentes em apoios comunitários, mas em ano eleitoral, apenas significam começo, não conclusão, com histórias que podem vir a ser similares ao antigo edifício hospitalar que, se foi um bom negócio para a Misericórdia de Torres Novas, criou algo de perverso em relação à cidade: a descentralização dos serviços públicos, numa zona sem nenhuma operacionalidade de estacionamento, já de si completamente usurpado pela Escola Prática da Policia. E por loucura e má gestão, em colapso.
Tenho-o escrito e mantenho. Torres Novas precisava duma política autárquica de esquerda, negociada entre o PS, o BE, o PCP, cidadãos de movimentos de esquerda, simples independentes. Um programa transparente, que, por um lado, cuidasse em esclarecer como se gerou tanta dívida, com que resultados, benefícios, regras , deslizes, através duma auditoria global. Dir-me-ão que devo ser inocente, o PS não alinharia numa auditoria da sua acção. Creio que quem não deve não teme. E de facto, por duas vezes votou contra a proposta da mesma apresentada pela CDU. Só que, sem ela, o PS nunca se libertará da suspeita de que esse endividamento não é totalmente transparente. E seria bom uma inventariação dos compromissos assumidos e não concretizados. E um meter a mão na massa das despesas dos cargos autárquicos, em todos os seus pormenores, deslocações, ajudas de custo, etc, nos concursos para cargos técnicos, nas relações inter-países, no que resultou destas para o concelho.
Num segundo ponto, um programa assente numa realidade sócio-económica-educativa-associativa-cultural–ambiental-patrimonial, que responda ao que fomos, o que somos, o que poderemos ser. Há que explicar o que se fará com um concelho em ruínas, abandonado, sem escolas no interior, nem centros de saúde, nem transportes regulares, nem jovens, nem agricultura, nem comércio, com uma indústria a caminho da extinção. Quando se verifica o estado das escolas centrais da vila, o fim do provisório que foi o ano lectivo na Escola Prática da Polícia, os projectos que se alinham à pressa para o próximo ano, dizer palavras não basta.
Lamentavelmente, a esquerda não correspondeu aos anseios dos cidadãos. O PS local não cumpre o que António José Seguro afirma no Congresso: transparência, isenção, rigor. Apresenta-nos uma candidatura, sem programa (como pode, se ainda não cumpriu o que prometeu durante estes vinte anos), com candidatos que parece estarem aí para abrirem as portas aos pesadelos do antes do 25 de Abril.
O PCP tem um programa próprio. Vinte anos de Carlos Tomé não demonstram, ainda que a organização, o desempenho, os objectivos sejam os do colectivo, que seja possível uma intervenção autárquica diferente. A experiência, além duma promessa, pode ser uma armadilha. Ninguém, na minha opinião, deveria ter cargos políticos eternos, contrariando a dialéctica e a mudança do mundo, da vida, das relações humanas. O PCP lá sabe…
O BE não estaria, penso, muito longe, dum caminho plural, democrático, que colocasse as populações acima dos interesses partidários. Mas, impossibilitado esse caminho de unidade à esquerda, não deve iludir-se com nomes, mas com um programa, claro, simples, objectivo, rigoroso.
Como cidadão, como ex-autarca, como torrejano, não estou disposto para mais do mesmo. As escolas encontram-se à beira da ruptura, com a fome a espreitar o quotidiano das nossas crianças; a saúde retrocedeu ao marcelismo, com uma política hospitalar cada vez mais próxima do abandono e da insegurança dos cidadãos, cada vez mais onerados por taxas, por despesas provenientes de deslocações absurdas, entre estabelecimentos hospitalares, cada vez com menos direitos de um tratamento humanitário, com maior imprevisibilidade de resultados clínicos favoráveis; o associativismo regrediu e apenas subvive pelo voluntariado de sempre; as freguesias foram despojadas da sua essencialidade patrimonial e histórica; o centro urbano revê-se cada vez mais em edifícios desventrados ou nas tabuletas do vende-se; a insegurança da vida comunitária aumenta com o abandono nocturno duma vigilância de proximidade; um comércio e uma indústria à beira do declínio; um emprego sem qualquer garantia de estabilidade; uma juventude obrigada à emigração, sem primeiro emprego; uma classe média totalmente angustiada, ante o futuro que lhe fora prometida com a Comunidade Europeia, as facilidades da Banca, e se encontra ante o despejo da casa, a reforma hipotecada por dívidas inadiáveis, impostos crescentes; um mundo do trabalho que, perdido este, se vê a viver do subsídio recessivo do desemprego, ou aceitando pagamentos iníquos por famílias que sobrevivem cada vez com menos, menos dignidade, mais humilhação, inqualificáveis caridadezinhas.
Para as autarquias, urge, Helena Pinto, um verdadeiro programa de regeneração destes vinte anos de total desrespeito pela cidadania, pela palavra dada, pelo compromisso assumido, pelo virar a cara ante o impudor, a desfaçatez, a arrogância caciquista e antidemocrática.
Aguardemos.
1 de Maio de 2013
António Mário escreve sempre às quintas-feiras em www.oriachense.pt