o riachense

Segunda,
29 de Abril de 2024
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Museu enche para festa de anos

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A assinatura da fusão da Casa Memorial Humberto Delgado com a Associação da Defesa do Património Histórico e Natural de Riachos foi o presente de aniversário do Museu Agrícola de Riachos. A partir de agora, a associação assume a designação de (ADPHN da) Região de Riachos.

 

 

 

 

 

Foi no dia 29 de Setembro de 1989 que se inaugurou o Museu Agrícola de Riachos, o corolário das actividades que a ADPHNR vinha a desenvolver desde a sua fundação no ano de 1986.
Para comemorar as duas décadas de existência, foram organizados dois dias recheados de eventos. No dia 23 houve a reconstituição da matança do porco à maneira tradicional, registado em vídeo por Martinho Branco para o Projecto de Recolha de Memórias, no âmbito do qual, também já foi realizado o registo audiovisual do método artesanal da apanha da azeitona.
Na tarde de sábado, dia 24, via-se um cesteiro na primeira sala do museu, que ao longo de toda a tarde mostrou um pouco do seu ofício. Mas as primeiras atenções foram centradas no auditório Dr. José Marques, onde tomou lugar a cerimónia de legalização da passagem da Casa Memorial Humberto Delgado para a tutela da agora denominada Associação de Defesa do Património Histórico e Natural da Região de Riachos.
Seguiram-se os discursos da praxe, primeiro pelo director do museu, Luís Mota, depois pelo presidente da associação, Carlos Trincão Marques e, por fim, pelo presidente da junta João Cardoso.
Pela projecção de imagens que testemunham o percurso dos últimos vinte anos, e pela voz de Luís Mota, foi feita a evocação de todos os participantes, “visitantes, estagiários e técnicos que ao longo destes anos acreditaram neste trabalho e nos ajudaram a crescer. Não podemos esquecer todos os que, não estando já entre nós, nos continuam a acompanhar com a memória que deles guardamos, forjando outro alento para continuar a jornada”.
O antropólogo Aurélio Lopes marcou presença no auditório com uma comunicação dedicada às identidades no Ribatejo, a sua área de investigação. Em breve explanação sobre o assentamento de visões e identidades do ser ribatejano, afirmou que “Riachos e o seu museu são exemplificativos de uma certa divergência ao modelo estereotipado do ribatejano”. (leia a comunicação completa em  baixo)
Seguiu-se a festa no pátio António Veríssimo, cujo poço tem uma nova nora, elemento representativo da técnica de puxar água através da tracção animal.
As “Camponesas de Riachos” deram as suas cantorias aos presentes, seguidas do convívio gastronómico entre a centena e meia de presentes, que fizeram desaparecer o porco morto na véspera, um pitéu depois de assado no espeto.
Na Galeria das Artes foi ainda inaugurada a exposição de pintura de Natércia Mendes de Almeida, com a presença da própria.

Um museu comunitário e uma casa memorial
Mafalda da Luz, directora adjunta do museu, confidencia que a dinamização da Casa Memorial terá de ser baseada na vertente da educação para a cidadania, tomando necessariamente como pedra de toque os valores inerentes à figura histórica do General Sem Medo.
Agora, sob a alçada de uma associação cuja principal actividade é a gestão de um museu comunitário, a integração da casa onde nasceu o General Sem Medo dependerá em grande parte do envolvimento do Agrupamento de Escolas Humberto Delgado, funcionando como canal de atracção da comunidade e a consequente e desejada articulação com a cultura e a história local.
Para já, a elaboração de um plano de requalificação do espaço museológico, estagnado desde a sua abertura, é a prioridade da equipa.

O catálogo
Museu organizado que se preze tem que ter um catálogo de apresentação e síntese das suas colecções.
Segundo o director Luís Mota, o almejado catálogo já começou a ser produzido e, dependendo da disponibilidade financeira, será lançado na próxima Festa da Bênção do Gado, em 2012.
Será um catálogo técnico, feito em equipa, que conterá artigos já publicados e outros mais recentes, produzidos por colaboradores da investigação do museu, segundo um critério de classificação dos textos.
O papel dos estagiários dos politécnicos de Tomar (Departamento de Gestão Turística e Cultural) e de Santarém tem sido importante no desempenho de variados aspectos museográficos, também na digitalização de documentos e fotografias do espólio do museu, elementos que também serão anexos ao catálogo.
O projecto de recolha de memórias em curso, também vai contribuindo para enriquecer os conteúdos, como é o caso do registo audiovisual da apanha da azeitona, feito recentemente para a colecção “O Azeite”.

 

 Ribatejo e Identidades

(Comunicação de Aurélio Lopes, proferida nas comemorações do vigésimo aniversário do Museu Agrícola de Riachos)


Estando o país numa encruzilhada em termos de divisão político-administrativa, em que, face às tentativas algo desajeitadas que se têm sucedido de implementação de modelos regionais mais ou menos incongruentes e esvaziados de poder e competências, se vislumbra uma tendência gradual no sentido da morte anunciada de um Ribatejo que há décadas não possui um lobby político que defenda os seus interesses globais, justifica-se, talvez, uma breve reflexão sobre as identidades culturais do Ribatejo.
Os defensores exacerbados dos valores ribatejanos têm reduzido a sua cultura a um conjunto de arquétipos regionais e, regionalistas, em que os homens ribatejanos são identificados, quase que em exclusivo, a “intrépidos campinos que garbosamente vivem cavalgando a sua liberdade pelas verdejantes lezírias da beira-tejo”!!
São estes personagens estereotipados. Não nasceram, não cresceram, não tiveram pais, não têm filhos! Não possuem atributos culturais para lá daqueles que a sua função de assalariado específico determina. Surgiram no mundo já assim configurados, adultos e montados e, assim, haverão de desaparecer. Indómitos e sobre-humanos, guardiões de virtudes seculares! Testemunho vivo das capacidades ancestrais da raça!!
Este cenário, de contornos míticos*, exclui, obviamente, como desnecessários, outros grupos sociais, etários ou sexuais, outras ocupações, profissões, costumes e tradições, formas de estar e de viver.
As mulheres, por exemplo, são reduzidas (como por um qualquer atavismo genético), a meros objectos de sedução, eventuais mecanismos de reprodução! Subservientes, símbolos de submissão, servem assim de contraponto ideal e indispensável ao exaltante padrão masculino, tido como excepcionalmente viril, orgulhoso, temerário e por aí adiante ...*
Na verdade, a caracterização cultural ribatejana tem vivido quase exclusivamente destes arquétipos! E se é verdade que os mesmos têm ajudado a promover turisticamente a Região (e daí a sua popularidade), o saldo final é francamente negativo.
Tal perspectiva, tem (por exemplo) alimentado equívocos particularmente gravosos acerca da diversidade, consistência e importância de uma cultura regional que, ao contrário de outras, se afirma precisamente por complexos sistemas mutacionais e pela dinâmica enriquecedora da heterogeneidade e aculturação.
Portanto, na tentativa de levantar um pouco o véu acerca da multifacetada cultura ribatejana (de que este museu constitui memória em grande parte viva) debruçar-nos-emos sobre um conjunto de ideias e reflexões respeitantes a um dos campos determinantes de um qualquer especifismo regional: os traços vivenciais da mentalidade rural e tradicional.

Em primeiro lugar, deve dizer-se que se existe nação neste mundo que apresenta uma indubitável homogeneidade socio-cultural é, sem dúvida, Portugal.
Não uma homogeneidade primeva e original, assente numa dimensão étnica pretensamente genuína, mas uma homogeneidade feita de múltiplas raízes (iberos, celtas, lusitanos, calaicos e afins, romanos, godos e suevos, mouros e negros) fundidos em oito séculos de história e miscegenações étnicas e culturais.
Uma homogeneidade feita parte de um todo maior; particularidades de uma certa maneira de ser português.
O que nos leva, aliás, à constatação de que somos um povo de caracteres híbridos mas bem definidos, enriquecidos por séculos de fusão e simbiose cultural, assentes numa invulgar diversidade de especificidades locais.
E é precisamente a constatação de que as partes que nos formam não nos separam mas nos unem, que permite, entre nós, uma pacífica e usual valorização das nossas variantes regionais*.
Podemos portanto, partir calmamente para a procura de traços de identidade cultural no Ribatejo.

Proprietários e jornaleiros

E comecemos por esclarecer que é a zona da Borda d’água, aquela em que a matriz cultural do Ribatejo adquire contornos mais específicos e diferenciados de grande parte do resto do país. Ora sendo esta uma sub-região de povoamento relativamente recente, decorrente de políticas de povoamento paralelas à drenagem das terras da bacia do Tejo e sendo a área do Vale do Tejo, grosso modo, uma zona de transição (de passagem dir-se-á) entre o interior remoto e as zonas de crescimento urbano do litoral, se existe, portanto, zona do país em que a ilusão de qualquer coisa como uma pretensa genuinidade étnica (que encontramos ainda, esboçada, num ou noutro regionalista mais entusiasta) constitui um autêntico disparate essa é, concerteza, o Ribatejo.
Mas se não existe uma identidade étnica existe, concerteza, uma identidade cultural. Ou se quisermos ser mais precisos, um complexo de identidades culturais que, no seu conjunto, nos marcam com especificidades próprias e peculiares. Ou se quisermos ser ainda mais precisos, marcam essencialmente, desta forma, a zona central do Ribatejo (vulgo lezíria) bem como, de forma menos intensa, áreas adjacentes, pertencentes já à charneca e ao bairro.*
E que identidades são essas afinal?
Marcas vivenciais e comportamentais que se fundam, precisamente, em vivências seculares que um meio ambiente específico, induziu e configurou. Vivências que, as grandes planícies aqui existentes, uma distribuição demográfica particular, repartições fundiárias diferenciadas e relações de trabalho peculiares no contexto do todo nacional, permitiram desenvolver.

Por exemplo, pode dizer-se que tradicionalmente a qualidade mais valorizada do carácter individual do homem do Vale do Tejo era (mais ainda que em qualquer outra região), o apreço dado ao factor capacidade de trabalho*, origem única, para a maior parte das pessoas, do rendimento familiar indispensável à sobrevivência.
Aos homens era-lhes exigido que fossem trabalhadores esforçados de “antes quebrar que torcer”.
“Trabalhador” era aqui, aliás, sinónimo de homem do campo de quem se dizia em situações em que o mesmo mantinha cadências infernais cavando o “eito” sem quebras de ritmo, num esforço a raiar o impossível; “Ah, trabalhador d’um raio!”
Ser “um braço de trabalho” é ainda hoje uma expressão largamente divulgada em toda esta área e que reflecte, como outras análogas, o reconhecimento da capacidade de alguns homens, considerados assim como capazes de ter e sustentar família. Tudo isto, num meio profissional em que as tarefas frequentemente desempenhadas em conjunto* (como acontece nos ranchos agrícolas), salientam facilmente as aptidões individuais.
Ter “fama de bom trabalhador” era, afinal, meio caminho andado para garantir na “praça” (instituição que marca uma outra originalidade laboral do Ribatejo) o necessário trabalho semanal. As diferenças de opinião acerca de tal e as rivalidades sobre os interesses em questão levavam, frequentemente, a desentendimentos e rixas em que o “pau”, ex-libris do homem do campo, manejado por braços fortes e mãos calejadas, muitas vezes ditava lei.
Ser um “homem” era, portanto, ser capaz de trabalhar como tal e de ganhar em correspondência!

Mas aqui não bastava ser, era preciso, também, parecer! Não bastava ser bom trabalhador, ou trabalhadora: era preciso apregoá-lo (publicitá-lo, diríamos hoje) salientar tal qualidade face aqueles que com eles competiam, bem como face a potenciais e efectivos empregadores*.
Tal condição impregnava, assim, um carácter de ostentação (ou, se quisermos, a ostentação de um carácter) fundamentado numa vontade férrea mas, igualmente numa desconfiança sistémica e recorrentes individualismos.
Eram, portanto, pessoas afirmativas e algo teimosas, ostensivas e algo vaidosas, necessitadas que estavam de manter os seus níveis de auto-estima sempre elevados.
Das mulheres esperava-se que dos homens se aproximassem em capacidade e resistência. E se as condições físicas fossem insuficientes, que a vontade inquebrável, então, as substituísse. Deviam ser “como um homem para trabalhar”. Para o patrão, concerteza, isso era o ideal principalmente ganhando, como ganhavam, o preço das mulheres!*
Isto, é claro, para lá de tratar das lides domésticas, da “ceia” já noite cerrada, da horta ao domingo se a havia, dos filhos todos os dias, eventualmente de alguns animais de capoeira.

Destas vivências de proletários agrícolas (aquilo a que aqui se chamava “jornaleiros”), emergem famílias cujos papéis sofrem alterações significativas. É que mulheres e jovens (rapazes e raparigas) auferem aqui salários autónomos, facilmente mensuráveis e, às vezes, quase tão elevados como os do chefe de família.
Aqui, ao contrário do que se depreenderia da simples aplicação do mito do homem ribatejano (e se depreende, ainda hoje, de algumas apreciações etnográficas pretensamente sapientes), o papel da mulher é mais marcante socio-profissionalmente. Estas são mais autónomas e reivindicativas, dispostas a liderar situações sociais e comunitárias diversas.
Não é uma inversão social, com certeza. O homem continua a ser o chefe de família e a exprimir de forma muitas vezes pública e violenta esse estatuto. Mas a relação com a mulher e os filhos sofre aqui de caracteres de subversão, expressos familiar e comunitariamente. Digamos que a imposição dessa liderança é, neste caso, aceite menos pacificamente: o “come e cala” de tantas outras zonas do país é aqui, diversas vezes, substituído pelo, mais problemático, come, …e não cala!
São as mulheres do campo, afinal, habituadas a trabalhos duros desde muito novas. Camponesas morenas, de corpo robusto e “pêlo na venta”, de sonoras gargalhadas e língua afiada, temperadas da geada e do calor da lezíria.
É a liberalidade que os imperativos socio-profissionais impõem. Liberalidade que lhes confere uma autonomia que exige, porém, correspondente responsabilização.

É assim um povo consciente de que o futuro é duro e difícil mas se constrói na labuta do dia-a-dia, aquele que, há séculos, aqui habita e trabalha. Etnicamente constituindo, como vimos, uma súmula dos diversos tipos humanos (remotos e recentes) que para aqui vieram em fases diferentes de um processo de povoamento continuado. É, na verdade, culturalmente que ele se define; pelas contingências de uma vivência de alguma forma singular no multifacetado contexto nacional.
Na verdade, esta é uma Região em que o êxito profissional é alcançado quase só em termos individuais. É o indivíduo, seja homem ou mulher, que é bom ou mau trabalhador e não o grupo de trabalho, de constituição volátil e que é visto como uma súmula de esforços individuais. Para além disso cada um é, em grande parte, um potencial rival no mercado de trabalho!

Também os ritos de passagem à idade adulta adquirem, aqui, singulares caracteres.
Ao contrário doutras zonas do norte do país em que as “sortes”,  só por si, marcam uma mudança efectiva de estatuto, aqui a prova crucial de maturidade é, na verdade, expressa pelo preço obtido pelo jovem no mercado local de trabalho. Aí, a sua capacidade é permanentemente avaliada e indispensável para vir, como se referiu, a ganhar o “preço dos homens”* ou “das mulheres”.

Na zona da lezíria as povoações possuem normalmente limites socio-profissionais que não coincidem necessariamente com os limites administrativos vigentes, já que aqueles se entrecruzam com os das aldeias vizinhas com cujos habitantes trabalham muitas vezes em comum. Deste modo também a endogamia se exerce, aqui, de forma menos vincada, embora os casamentos intra-comunitários continuassem a ser os mais usuais e, fosse normal, por exemplo, o desencadear de incidentes de rivalidade amorosa nos bailes das sociedades recreativas ou outros afins, principalmente se da parte dos forasteiros transparecesse qualquer atitude de desafio ou ostentação.
Algumas vezes, principalmente nas povoações que se situam próximo dos centros urbanos, as rivalidades inter-classistas internas personalizando-se nos antagonismos camponeses/operários (leia-se trabalhadores do campo versus trabalhadores dos sectores secundários e terceários) suplantavam nitidamente a perspectiva interna/externa assumida, de facto, de forma menos radical.

Diferentes são, igualmente, as relações destas gentes com a religião institucional. A imagem da Igreja está aqui, desde sempre, ligada às suas relações privilegiadas com as classes superiores, proprietários e lavradores principalmente que, com o padre, constituem os os notáveis locais e que se expressavam, por exemplo, na existência de capelas privadas onde se efectuavam missas particulares destinadas aos senhores e à criadagem da herdades.
E se é verdade que as devoções geraram um pouco por todo o Ribatejo, romarias de grande popularidade, a função sacerdotal de intermediário oficioso com a divindade, foi sempre olhada, aqui, com particular desconfiança.
Este é claramente um dos aspectos que mais marcam a especificidade cultural nesta região. Aliás a ligação mística à terra (aqui distante e indirecta) parece constituir um dos factores que mais influenciam o carácter religioso de uma qualquer população rural, que vê nesta, e na sua maior ou menor magnânima fertilidade o resultado directo ou indirecto da intervenção divina*.
Ora, em áreas em que a produtividade da terra não se reflecte, imediata e necessariamente, na situação económica sempre difícil da maioria dos trabalhadores, e os salários obtidos na “praça” obedecem mais a correlações de força e aos imperativos sempre presentes da oferta/procura, a conexão com a essência mística da terra-mãe (arquétipo de fertilidade e paradigma de valências telúricas) é, não só indirecta, como desfasada no tempo, apresentando-se ainda como exterior (e de alguma forma indiferente), à qualidade de vida de cada um.

Contudo, romarias sustentadas por devoções individuais, pululavam em tempos idos pelo Ribatejo. Essencialmente ligadas a valências da natureza de que participam humanos, animais e plantas, tendendo todos eles a impregnar-se de uma evanescente fertilidade.
Fertilidade que envolve os seus rituais da simbologia do pão e a sua configuração de enfeites florais, ramagens e frutos, qualidade ainda hoje tão marcante em festas como a dos Tabuleiros em Tomar (uma antiga festa do Espírito Santo) ou a Festa da Senhora da Boa Viagem em Constância; uma antiga festa da consagração dos barcos que faziam, no Tejo, o transporte de pessoas e mercadorias.
E se as festas comunitárias não tinham no Vale do Tejo a importância doutras zonas do país, todas as safras, todas as grandes tarefas agrícolas colectivas, terminavam obrigatória e invariavelmente em festivas e garridas “adiafas”; feitas de comeres, cantares e dançares.

Conclusão

Poder-se-á dizer, em suma, que esta é uma Região habitada por homens e mulheres habituados a viver com austeridade e a trabalhar, duramente, por necessidade. Homens e mulheres moldados ao jeito do sol da lezíria e da imensidão perene dos campos da Borda d'água!
Uma gente cuja filosofia de vida se desenvolve entre dois extremos que as contingências sociais obrigam: desde uma incorrigível ostentação (algumas vezes a raiar a bravata), como mecanismo indispensável de afirmação laboral, até uma não menos necessária subserviência, em público, face ao patrão ou aos capatazes, garantes do trabalho, tantas vezes escasso.
Um meio social em que a extrema hierarquização social, suportada fundiariamente, despoleta, desde há séculos, tensões sociais várias entre os donos da terra e as grandes massas de trabalhadores braçais. Tensões a que os tempos modernos conferiram um enquadramento ideológico, ainda hoje facilmente visível*.
Aqui, a alimentação, era simples e austera. Os divertimentos, rudimentares e de carácter local. A relação com as instituições (civis e religiosas), problemáticas e muitas vezes conflituosas. O vestuário, sempre do pano mais grosseiro e durável. A reutilização de todos os artefactos, uma constante. A reciclagem do vestuário, necessidade indispensável.
A psicologia social é dualista e determinista. O auto-elogio público e ostensivo, imprescindível lugar-comum. Aqui cada um é visto, em grande parte, como alguém que a si próprio se fez!
O comunitarismo é entendido em termos horizontais; englobando essencialmente os grupos de trabalhadores do campo. As relações com as outras classes sociais, operários ou burgueses, geradoras de conflitos e antagonismos.
As coisas da Igreja são-lhes muitas vezes exteriores e alheias. Coisas de ricos que têm muito a perder, a começar pelo tempo.
Gente que vivia da terra; dos rendimentos provenientes da posse da mesma ou do simples aluguer, “à jorna”, da sua força de trabalho. Usufrutos diferentes numa sociedade fortemente hierarquizada entre ricos e pobres, com alguns, poucos, remediados. Todos, contudo, directa ou indirectamente vivendo dos frutos da terra: desta terra da borda-d'água, ao contrário dos homens, sempre generosa e magnânima!

São, assim, marcas sociais e culturais: expressões de formas de estar e de viver, que fazem do ribatejano (homem e mulher) alguém que se afirma pelas particularidades dos seus caracteres, pelas qualidades e valores que encarna e professa.
Não, necessariamente, melhores ou piores que os homens e mulheres das outras regiões! Apenas diferentes!
Diferenças que a globalidade e o diluir da ruralidade vão tornando menos nítidas!
Mas que mesmo assim, são ainda visíveis, como traço de identidade, aqui e além, um pouco por todo o Ribatejo!
                                                                                                       
                                                                                                               Aurélio Lopes

Actualizado em ( Terça, 03 Novembro 2009 19:54 )  
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