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Ana Paula Lopes publica «Açúcar e Canela»: a felicidade nas coisas simples

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Ana Paula Lopes é professora de matemática do 3.º ciclo e secundário e aos 34 anos resolveu publicar um livro que tinha na gaveta há algum tempo.
A autora da coluna Viver neste mundo, do jornal O Riachense, vai regressar à escola em onde estudou até ao 9.º ano, a Dr. António Chora Barroso, em Riachos, para fazer o lançamento e apresentação pública do livro Açúcar e Canela, publicado pela Chiado Editora (dia 4 de Outubro às 16h30 com apresentação a cargo de António Mina). 
Açúcar e Canela é um romance de leitura “descontraída e descomprometida, de linguagem corrida e local, sem pretensões de reflexão profunda, apenas e só um levantar de questões”. Um livro em que a narrativa é conduzida pelas memórias da juventude que vão sendo evocadas ao ritmo da sazonalidade dos aromas e doces tradicionais.

Como resumirias a história do livro?
Começa com uma viagem que a personagem principal faz à aldeia dos pais para os visitar, num fim-de-semana normal. Repentinamente começa a lembrar-se de coisas que tinha vivido na sua infância na aldeia, memórias levantadas pelo facto de a mãe estar a fazer compota de tomate, que era uma coisa que a avó fazia muito.
Então ela começa a lembrar-se das coisas que viveu lá e de como se sentia bem ali. A Rita é uma médica, veio de uma família pobre do campo e conseguiu chegar onde queria. Acontece que, apesar de todo esse sucesso, ela chega à conclusão de que afinal não era aquilo que ela queria.
Começam a acontecer uma série de imprevistos que fazem com que as lembranças se tornem cada vez mais vivas e que ela questione as escolhas que fez na vida. Daí para a frente, o livro mostra-nos como é que a Rita resolve os seus problemas, mas sempre nesta perspectiva de, se calhar, dar outro rumo à vida. E encontrar um refúgio inesperado nas visitas à aldeia. 

É um romance com um tema por trás...
No fundo, o livro tem a ver com o facto de, com o 25 de Abril, as pessoas deixaram de ser aquilo em que nasciam; quem nascia pobre era pobre, quem nascia rico tinha um mar de oportunidades. Com a escolaridade obrigatória e gratuita para toda e gente, deixou de ser necessariamente assim, e as pessoas da minha geração - e da geração da Rita - puderam escolher as suas profissões e ter a carreira de topo que sonharam e ser tudo aquilo que os pais imaginaram que poderiam ser. Acontece que às vezes isso não chega, a felicidade, se calhar, encontra-se noutras coisas mais simples. O livro foca-se muito nessa procura da Rita para dar um sentido à vida através de pequenas coisas. Pequenas coisas que nos fazem felizes.

Existe algum paralelo entre ti e a Rita?
Não, o livro não tem nada a ver comigo. Quem me dera ser tão perfeita como esta personagem. E também não é a história de ninguém, embora eu ache que as personagens principais têm coisas que eu já vi noutras pessoas, mas não se refere a uma única pessoa. Portanto, se calhar a Rita é uma série de situações e virtudes que eu fui conhecendo em várias pessoas diferentes, e o Francisco também resume algumas qualidades e características que eu já conheci, mas não numa pessoa propriamente dita. As personagens todas do livro têm bocadinhos de alguém que eu já conheci, mas não retratam ninguém em particular.

Como foi o processo de escrita deste livro?
No início teve a ver com um desabafo, comecei a contar uma história quando estava sozinha. Era só ir contando histórias e ver como é que lidava com elas. Comecei por escrever uma boa parte rapidamente, num mês ou dois. Mas depois o livro ganhou corpo e tive de decidir o que fazer com ele. E aí já fui mais disciplinada, sim, já tinha como intuito escrever o capítulo tal, dar uma conclusão para a personagem tal, dar-lhe uma estrutura... Fui mais rígida comigo própria, impus horários para acabar o livro. Porque às tantas tinha um grande corpo sem fim. Tive de decidir se avançava ou não, e avancei.
Decidi terminá-lo para concorrer a um concurso literário. Entretanto não fui apurada e guardei-o um ano e tal. E um dia, por descargo de consciência, enviei-o para a Chiado Editora, porque nunca tinha tido nenhum feedback, nunca o tinha mostrado a ninguém. E passado meia dúzia de dias recebi a proposta de edição e fiquei logo muito contente, como é óbvio.
Nunca tinha escrito nada, mesmo os artigos de jornal vieram depois de o livro já estar feito.

O que significa para ti escrever? Vais dar continuidade?
Gostava muito de dar continuidade, mas primeiro quero saber se as pessoas gostam de ler as coisas que eu escrevo. Eu gosto de escrever para mim, acho que todos os autores escrevem para si. Gosto do acto de estar a escrever, sozinha, com o computador no colo, e a inventar a história. Gosto da parte de inventar as personagens e de lhes dar um destino.
Quando tive de acabar este livro, sofri imenso, estava sempre a pensar no Francisco e na Rita, embora não sejam pessoas verdadeiras. Eu imagino-as fisicamente, mas descrevo pouco as personagens em termos fisícos, pouco ou nada. Todos são caracterizados pelas suas convicções e pelas coisas que dizem.
Num novo livro que estou a escrever, há mais personagens, é uma obra mais complexa, vai ser complicado arranjar fim para todas aquelas personagens.
Se eu continuar a escrever, será sempre sobre pessoas, como é que elas são, como é que elas pensam e como é que elas saiem dos problemas da vida. Alguns problemas que retrato são muito simples, outros são muito complexos, mas principalmente o que me captiva é criar as personagens e falar sobre elas.

Existe um público que vês a aderir mais ao livro?
Sou muito nova. O que está aqui retratado tem muito a ver com a forma como as pessoas da minha idade se dão umas com as outras. Tratar os pais por tu, por exemplo, ou a forma como temos uma visão mais pragmática da vida, não tão complexa e não com tanto peso nem conotação social.
Mas acho que, pelo menos duas gerações se vão rever neste livro: a minha, dos 30/40 anos, e a dos nossos pais. Porque eles vão ver aqui, em parte, o que as pessoas como eu pensam mas não têm coragem de dizer, aquilo que não se conta ou não se pode dizer aos pais mas que eles gostavam de saber sobre nós.
E também uma outra questão que pode não ser muito explícita no livro, mas está lá. A forma como estes pais pressionaram muito os seus filhos no sentido de: tendo tantas oportunidades, como é que não temos uma vida tão boa? Pelo menos estas duas gerações vão ver-se retratadas e identificar-se com algumas passagens deste livro.
Depois o facto de ter muitas referências à vida no campo, aqui... Não é sobre Riachos nem sobre como se vive cá. Mas como se vive no Ribatejo em geral; com a proximidade de Lisboa, em que podemos ter tudo o que queremos, porque podemos lá ir quando nos apetecer, e ao mesmo tempo, tão longe porque vivemos de uma maneira tão diferente. Temos de um lado o campo a bater-nos à porta, e do outro a cidade.
E depois a parte das memórias de infância, acho que falo de memórias que são de todos nós. A presença do avô e da avó, a Rita sofre muito com a morte dos avós, e com a falta de senti-los. A presença desses elementos mais velhos está em todo o livro.

No livro projectas as referências com que cresceste?
Não só minhas, mas de muita gente que eu conheci e que viveram alguns destes problemas, sim. Não tem muito assim de mim, mas tem muito das pessoas da minha idade, isso acho que tem.

Os romances são um escape à tua vida na escola? Se fosses engenheira numa fábrica, escreverias na mesma?
Se calhar não. Ao contrário do que as pessoas possam imaginar, apesar de todas as directrizes profissionais daquilo que um professor tem de transmitir, tudo no ensino se baseia nas relações.
O professor acaba por ser uma pessoa privilegiada, que tem quase o mesmo privilégio de um psicólogo: conhece muito mais gente do que todos os outros profissionais. Tem muitas turmas, muitos colegas de trabalho e eu , tendo esta particularidade de ir saltando de escola em escola, também vou conhecendo muita gente.
Conheci muitas pessoas mais velhas que eu, muitas pessoas da minha idade, e muitos jovens. [A escrita] relaciona-se com a minha vida profissional neste sentido: tenho muito acesso a  pessoas, a vidas e a histórias de vida. Desabafo com muita gente e muita gente desabafa comigo, mesmo os mais pequenos, o que faz com que eu consiga pautar todo o meu dia-a-dia, toda a minha vida, por estar sempre ao pé de alguém. Como não tenho um emprego em que ando sozinha, acabo por, sem querer, absorver a realidade das outras pessoas, a maneira de elas serem, os problemas que elas têm. Se calhar aí tenho muito mais material para escrever do que se fosse engenheira numa fábrica.

Depois de tanta escola e uma carreira já com uns anos, porque é que escolheste a escola de Riachos para fazer o lançamento?
Porque, como sou professora, achei que o lançamento tinha de ser feito num espaço relacionado com o ensino e a educação; ou numa biblioteca ou numa escola.
Nesta escola há uma relação muito próxima com a comunidade, e da comunidade com a escola, por vários aspectos. Primeiro porque a escola foi quase que uma exigência nossa [da comunidade] e, quando foi construída, foi motivo de orgulho, a partir daí a comunidade sempre se relacionou com a escola.
Por outro lado, acho que com as obras, [a Chora Barroso] se tornou mesmo num espaço de excelência para os alunos. Acho que a comunidade de Riachos precisa de ver quanto a escola foi melhorada e as condições que oferece, para vários momentos. Eu acho que o investimento que foi feito, até pessoal das pessoas que lá trabalham, o ambiente acolhedor e familiar que tem, não pode deixar de ser partilhado com a comunidade. Porque a escola serve esta comunidade e a comunidade tem que a conhecer, tem que lá ir. E acho que o lançamento do livro é mais uma oportunidade para quem não conhece ir ver a mais-valia que ali está. Temos que lutar muito para manter a escola a funcionar em pleno, com as condições e o pessoal humano que tem.

Actualizado em ( Segunda, 29 Setembro 2014 17:01 )  
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