o riachense

Domingo,
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Carlos Gameiro

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Matar a vaca?

 

O amigo Ricardo não se importará que recupere aqui a conversa que tivemos há uns tempos:

_ “Temos é que matar a vaca” – foi a expressão que usou. Na verdade não tenho a certeza que a tenha usado no sentido em que a tomei, mas é verdade que todos a ouvimos ou dissemos já, e que todos lhe damos mais ou menos o mesmo sentido: O Estado é uma enorme vaca, que todos, ou quase todos, somos obrigados a alimentar, e em cujas tetas mama uma grande parte da população, essa corja de preguiçosos brutos e incompetentes, vulgo Função Pública.

Bem, comecemos pela escolha do animal: Como ouvi um criador de gado explicar a uma bonita e surpreendida cara da televisão de todos nós, a vaca gera, normalmente, ninhadas de apenas um descendente, pelo que, se queremos uma analogia com uma quantidade enorme de malta a sugar alegremente na teta do bicho, mais vale chamar à coisa… porca. Essa sim, tem ninhadas grandes e até gosta de chafurdar naquilo em que todos nos sentimos também cada vez mais enterrados.

Mas será mesmo necessário matar a vaca…ou a porca, ou cortar o acesso dos leitões à teta? Será isto a solução para reduzir os custos de alimentar o animal – a porca…ou a vaca, ou o tal monstro que se calhar até é uma mistura das duas?

Quem já viu uma ninhada de porcos crescer sabe que nem todos os leitõezinhos são iguais. Há os que crescem saudáveis, gordos e luzidios, mas há também sempre um ou dois enfezados, que raramente conseguem chegar à teta, e que acabam normal e naturalmente por ser empurrados, pisados pelos irmãos e até pela própria mãe e cujo destino, não sendo afinal diferente do dos irmãos, é dramaticamente antecipado, normalmente por opção do próprio produtor. Pergunte-se a qualquer um português não trabalhador do estado, empregado ou desempregado, e a solução escolhida será quase sempre esta, sendo que o leitão a abater corresponde também quase sempre aos mesmos: funcionários públicos, professores, médicos e enfermeiros. Não pretendo aqui que estas classes profissionais correspondam a uma parte pequena da ninhada. Não é. Antes pelo contrário, mas considerar o seu peso no orçamento do estado sem considerar a importância que têm para o desenvolvimento de uma sociedade verdadeiramente evoluída, ou sem contrapesar os custos a haver de todos nós, a muito curto prazo, se acabássemos com aquilo que nos garante de fato, a todos nós - seria mesmo bom que fosse em igualdade - a saúde, a educação, a paz (nem que seja social), e já nem falo do pão e da habitação (Oh!... Essa maldita e nefasta Constituição!). Imaginam-se a viver num país em que só os filhos do Senhor Doutor têm direito a ser doutores? Imaginam o que faríamos com os milhares de jovens que ainda vão sendo salvos, ainda que por um sistema educativo imperfeito, de um destino de marginalidade e miséria? Imaginam ver-se doentes ou feridos, barrados à entrada de um hospital por não terem em dia o seguro necessário? Alguns ainda se lembrarão de coisas deste género. Se calhar já estivemos mais longe, e não é difícil encontrar nos costumados países de referência quem já lá esteja (os maus exemplos também deviam servir-nos).

O problema é que muitas vezes nos fazemos esquecidos em relação ao que representa realmente a vaca. Fazemos como o leitão que é empurrado e espezinhado, grunhimos um bocadinho, mandamos umas bocas no café e nos transportes cada vez menos públicos, escrevemos umas linhas de vez em quando e pouco mais.

O problema é que a vaca é uma porca, que gosta de se deitar nos melhores hotéis, de almoçar no Tavares e jantar no Gambrinus depois de cumprida a sua obrigação de figurante na novela diária da ARTV (não, não é nenhum canal televisão dedicado à ARTe). Se calhar devíamos era tirar as milhas de avião e o cartão de crédito à vaca. Se calhar devíamos tirar o sorriso da boca dos amigos da vaca, que bebem champanhe pelos gabinetes das empresas agora privadas, que sabem estar à vontade, que podem cometer as carneiradas que quiserem, pois haverá sempre uma teta à espera para os salvar, à custa da porca,… da vaca e em boa parte dos tais funcionários públicos.

Temos que matar a vaca? Não, a vaca pode ser salva, e a sua salvação pode ser afinal a nossa própria redenção. Precisamos é deitar mãos à obra. Podemos começar por arregaçar as mangas e enfiar o boletim de voto no buraco da urna da vaca, e não deixar para troikanos e outros extraterrestres decisões que devem ser nossas.

 

O autor deste texto escreveu umas vezes segundo o antigo acordo ortográfico e outras segundo o novo, por nenhuma razão em especial. Anda confuso com tanta idiotice.

 

Actualizado em ( Quinta, 08 Agosto 2013 12:04 )  
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